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terça-feira, 12 de abril de 2011

Bento XVI e os Falsários, por Gabriel Viviani

Quarenta anos completam-se desde que, em 1971, o dominicano Gustavo Gutiérrez publicou Teología de la Liberación-Perspectivas. Considerado texto fundamental da Teologia da Libertação, a obra de Gutiérrez é, na realidade, somente a compilação das ideias socialistas que dominavam o ambiente das congregações religiosas no pós-concílio. Tempo de padres guerrilheiros, de questionamento da autoridade papal. Fernando Cardenal desafiando, com petulância irritante, a ordem de abandonar o cargo ocupado no regime revolucionário e ditatorial da Nicarágua; dominicanos abjurando a Bíblia e o crucifixo em detrimento das armas, o Reino de Deus em detrimento do comunismo; Dom Hélder Câmara e Dom Paulo Evaristo Arns flertando desavergonhadamente com Fidel Castro… Se, em 1978, João Paulo II não se elegesse papa, a Igreja talvez se transformasse apenas noutro comissariado socialista.  Karol Wojtyla enfrentou bravamente os teólogos da libertação, conseguindo conter a hemorragia. Seria, no entanto, ingênuo supor que os chamados teólogos da libertação tenham-se considerado definitivamente derrotados.

               Visite periodicamente o site da CNBB, terá sempre oportunidade de acompanhar notícias a respeito das Comunidades Eclesiais de Base. Sim, os comunistas da libertação encontram ótima acolhida dentro da CNBB. Recentemente, navegando naquele espaço, acabei descobrindo o documento intitulado Carta às Irmãs e aos Irmãos das CEBs e a todo Povo de Deus. O tal documento refere-se ao 12º encontro intereclesial das CEBs, ocorrido em Porto Velho (Ro), no ano de 2009.  A carta não chega a surpreender. O leitor experimentado logo compreende as verdadeiras intenções por trás das inocentíssimas “causas sociais”. Que há de interessante no documento das Comunidades Eclesias de Base? Recordo o que certo sacerdote disse-me: Os discursos do Papa Bento XVI na V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e Caribenho trouxeram novas esperanças para o trabalho das CEBs. É, segundo soube, e como sempre, os teólogos da libertação trataram de, rapidamente, distorcer as palavras de Bento XVI, justificando assim suas heterodoxias.
              Mas é claro, o Papa criticou a miséria do continente latinoamericano, lamentou o espírito consumista, recorreu à terminologia das conferências anteriores (usando mesmo a controvertida opção preferencial pelos pobres), recorreu à encíclica Populorum Progressio a fim de recordar as desigualdades sociais, e terminou observando que certas estruturas da sociedade criam injustiças. Joseph Ratzinger ter-se-ia convertido à Teologia da Libertação? Podemos colar adjetivos variados a Leonardo Boff e Frei Betto, por exemplo, epítetos impublicáveis neste blog de orientação católica, e, contudo, jamais pretenderia tê-los por “ingênuos” ou “tolos”. Tanto eles como eu sabemos perfeitamente que Bento XVI, nos seus discursos, esteve longe, mas longe realmente de tratar aqueles conceitos sob o ponto de vista do marxismo, especialidade da TdeL. Que importância isso há de ter para os teólogos da libertação? Se esses sujeitos distorcem o sentido das palavras de Cristo tencionando, assim, dar-lhe interpretação ideológica, por que não acabariam fazendo o mesmo com o discurso do Papa? Eis, então, que o fizeram! Os participantes das CEBs espalhadas pelo Brasil julgaram-se, portanto, absolutamente liberados para vincular o discurso do Papa à doutrinação ideológica.
              Os argumentos de Joseph Ratzinger não comportam interpretações contraditórias. Se no discurso inaugural do CELAM, em Aparecida, o Papa cuidadosamente investiga o problema das desigualdades sociais, abordando, inclusive, a opção preferencial pelos pobres, afasta-se igualmente das soluções materialistas. O Papa não sugere ideologias ou transformações no sistema econômico como caminho para o fim dessas desigualdades. A bem da verdade, Bento XVI rechaça o capitalismo e o marxismo:
              Tanto o capitalismo como o marxismo prometeram encontrar o caminho para a criação de estruturas justas e afirmaram que estas, uma vez estabelecidas, funcionariam por si mesmas; afirmaram que não só não teriam tido necessidade de uma moralidade individual precedente, mas que elas fomentariam a moralidade comum. E esta promessa ideológica se demonstrou como falsa.
              Mais adiante Bento XVI diz:
               … a sociedade na que Deus está ausente não encontra o consenso necessário sobre os valores morais e a força para viver segundo a pauta destes valores, mesmo que contra os próprios interesses.
              O trecho é revelador, e podemos até considerá-lo o centro da argumentação. Joseph Ratzinger parte da realidade de Deus, realidade essencialmente espiritual, e afiançado pela constatação metafísica do Ser, vai direcionando seu discurso até a problemática social. Ou seja, a teologia e a espiritualidade têm necessariamente que começar em Deus, no contato com o Espírito Santo. Só então o cristianismo se encontrará apto a enfrentar as desigualdades sociais. O materialismo dos capitalistas e dos marxistas não consegue senão implantar mais confusão e desgraça. As ideologias sempre fracassarão!
              Outro significado qualquer que se tencione dar às palavras do Sumo Pontífice é somente falsificação. Mas a Carta às Irmãs e aos Irmãos das CEBs e a todo Povo de Deus demonstra que, entre verdade e falsidade, os teólogos da libertação sempre escolhem a falsidade. Observada sob o ponto de vista da hermenêutica papal, a Carta simplesmente não tem sentido. Só a chave de interpretação marxista consegue explicá-la. Porém, o que é essa chave senão a inversão completa daquilo que Joseph Ratzinger ensinou na abertura do congresso? Se Bento XVI insiste no fracasso do marxismo, as CEBs usam sua terminologia ideológica, buscando refundar a sociedade, não através da experiência religiosa e espiritual, como pretende o Papa, mas sim através da mobilização dos movimentos ditos sociais.
              Como se vê, quarenta anos depois, a Teologia da Libertação segue destilando seu veneno subversivo, não a serviço de Deus, mas da luta revolucionária.
Site do autor: http://www.gabrielviviani.com/

1 comentário:

  1. Gostei muito do texto. Vim através do grupo Catolicismo , do FB.
    Estou cada vez mais estarrecida com o estrago que as más interpretações do CVII. No entanto o CVII dá margem a elas. Que essa iniciativa de Bento XVI de se repensar na hermenêutica do CVII dê bons frutos. O estrago é imenso.
    Vou divulgar o post, posso?
    Até mais

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